domingo, 7 de dezembro de 2008

Trechos de uma entrevista ao DN de um homem lúcido e bastante inteligente, João Lobo Antunes, conhecido pelo exercício da medicina, embora possua o vício da escrita está-lhe nas veias.
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Aconselhava mais pousio a mais políticos?

As pessoas devem ter liberdade para exercer a acção cívica como pretendem. Há maneiras de o fazer mais e menos elegantes - quando digo elegantes, quero dizer mais decentes - porque se nota nalguns que a intervenção é acima de tudo de azedume e de uma enorme expressão de frustração, que muitas vezes tolda completamente o juízo e inquina a expressão da sua posição
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Eu sou um homem de esperança.

Só podemos contar com a esperança?

Não, a esperança não pode ser um perfume abstracto, e uma pessoa não pode aspergir-se dela com um spray. Acredito no trabalho e no dedicar o nosso esforço, a inteligência, as capacidades, as aptidões ao serviço de qualquer coisa e acho que a sociedade passa muito tempo entretida com coisas secundárias, menores e medíocres, que distraem e que levam as pessoas a não trabalharem.
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Acredita em Deus?

Isso faz parte da reserva pessoal que eu, ao longo destes anos, procuro manter. Mas acredito no que há de sagrado naquilo que faço.

O que há de sagrado?

Acho que é uma função sagrada, tem uma liturgia própria e mandamentos próprios. E acredito também naquilo que falo várias vezes no livro, na função pastoral no sentido evangélico do termo: que não podemos deixar que uma ovelha do rebanho se perca.
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O seu pai, também médico, acreditava em Deus?

Eu acho que, no final da vida, se não acreditava em Deus... Uma das pessoas que eu mais admirava quando estava a morrer virou-se para a mulher e disse: "Dieu n'est pas loin." [Deus não está longe.] Foi uma pessoa que muito me marcou e tenho pensado muito no que é que ele quereria dizer com isto.
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Em tempos disse que era um homem de rituais. Continua a praticá-los?

Sempre. Os rituais e as rotinas são, ao contrário do que se pensa, importantes. Eu fiquei muito consolado quando há uns anos disseram que as rotinas eram uma marca de superioridade intelectual. Fiquei aliviadíssimo, porque, de facto, permitem libertar-nos a mente para outras coisas. Se pensarmos bem que a aterragem de um avião é basicamente o cumprimento de rituais de segurança... Quem não cumpre rituais quando se é cirurgião faz correr ao seu doente enormes riscos. Portanto, nalguns aspectos, sou ritualista.|"

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