quarta-feira, 5 de dezembro de 2007
Na busca da Verdade, buscando sempre....
O HOMEM QUE FAZIA PERGUNTAS
Texto de NUNO GALOPIM saído no "Diário de Notícias" de 29/10/07 sobre o livro de Carl Sagan recentemente publicado em português "As Variedades da Experiência Científica":
Textos inéditos de Carl Sagan são agora reunidos em 'As Variedades da Experiência Científica', livro que abre uma colecção na qual a Gradiva vai republicar a integral da sua obra. Seguem-se, brevemente, as reedições de 'Sombras de Antepassados Esquecidos' e 'O Cérebro de Broca'..
"Se não concordares com um homem, deixa-o viver. Não encontrarás outro em cem milhões de galáxias..." Esta é a frase de Carl Sagan de que Ann Druyan mais gosta. A mulher que com ele viveu e agora assina a introdução de As Variedades da Experiência Científica, livro de inéditos que a Gradiva acaba de lançar entre nós, falou em exclusivo ao DN sobre estes textos e o homem que os deixou. Este é um livro que junta uma série de ideias apresentadas em conferências e que reflecte sobre temas caros a Carl Sagan, nomeadamente um antigo debate entre o pensamento religioso e o científico.
"O que torna a ciência tão poderosa é a sua capacidade para questionar, incessantemente, as coisas. E essa é uma diferença fundamental", explica Ann Druyan, para quem o verdadeiro antagonismo não se estabelece entre a ciência e a religião, mas sim entre aquela e o fundamentalismo. "Não creio que esta possa coexistir com o fundamentalismo", sublinha. "São perspectivas radicalmente distintas sobre o mundo. Enquanto uma diz que não se pode questionar nada, a outra defende que se deve questionar absolutamente tudo! A única coisa sagrada é poder questionar. Fazer perguntas, usar o pouco que sabemos para poder gerar novas questões. As metodologias são diferentes, assim como os seus objectivos distintos", sublinha.
Ann Druyan recorda, todavia, o grande interesse de Sagan pela reflexão sobre o divino. E lembra inclusivamente um encontro a que teve "o privilégio de comparecer" com o Dalai Lama. Desse momento lembra que terão discutido que, "se a ciência descobrisse uma nova forma de encarar qualquer coisa que contradissesse os fundamentos do budismo, então o budismo teria de ser repensado".
Sagan era agnóstico "como a ciência o pede", explica Ann Druyan. Ou seja, "na ausência de factos, de evidências, só se pode viver com a pergunta". Era, como lembra, "um agnóstico na verdadeira essência da palavra: não sabia. Não era, portanto, ateu. De resto, Carl dizia que o ateísmo era uma forma de reacção ao excesso de zelo religioso. Excessos, alguns, horrendos. Mas sabia que não havia uma resposta científica para Deus." E da dúvida nasceram reflexões, muitas, algumas delas apresentadas neste livro agora publicado.
Ann Druyan partilha muitos destes ideais. E com Sagan viveu muitas das suas dúvidas e reflexões. Ainda hoje debate estes temas. E acrescenta que, muitas vezes, algumas "religiões tornam-se ortodoxas, ficam agarradas a uma visão única das coisas". Ressalva que a ciência faz o oposto. "E por isso é que a ciência nos leva ao exterior do sistema solar. Chegámos a muitas das luas dos planetas exteriores..." Ou, como depois acrescenta, permite-nos contemplar "a consciência da vastidão do cosmos. Podemos ver dez mil galáxias numa mesma imagem do Hubble... Permite ter uma perspectiva mais abrangente".
No texto de introdução às "Variedades da Experiência Científica", Ann Druyan sugere que, à sua maneira, Carl Sagan obtinha um "conforto espiritual" na ciência. Ao DN explicou o que queria dizer com estas palavras: "Se [Carl] pudesse responder a uma boa questão, se pudesse ir em busca de uma resposta, ele tinha esse tipo de conforto. Tinha uma curiosidade apaixonante."
È isto que nos deve mover sempre, questionar, questionar sempre, para compreender, ou tentar compreender. E é com estas mentes priveligiadas que vamos mais além, avançando passo a passo.
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