sexta-feira, 3 de abril de 2009


SAMANTA

― Finalmente vou conhecer a famosa Samanta... ― disse Gustavo.
― Você vai amar a Samanta, Gu! ― disse Suzaninha.
Suzaninha não parara de sorrir desde que recebera o telefonema da irmã dizendo que chegaria no dia seguinte e ficaria com eles. Samanta não era apenas sua irmã mais velha. Era o seu ídolo. Gustavo já cansara de ouvir as histórias de Samanta que Suzaninha contava um brilho nos olhos. Gustavo não estava em casa quando Samanta chegou. Suzaninha abraçou a irmã, emocionada. Samanta afastou-a, examinou-lhe o rosto e a roupa e decretou:
― Você está péssima.
― Você está linda!
― Esse seu marido não cuida de você, não?
― Cuida. Ele é formidável. Você vai ver.
E depois:
― Você vai amar o Gustavo, Sam!
Samanta dormiria numa cama de armar na salinha do computador do Gustavo. Depois de examinar o apartamento com uma leve expressão de desencanto, Samanta atirou-se numa poltrona, aceitou uma bebida. Depois um relatório de casa, onde continuava tudo a mesma merda. A novidade era ela. Samanta tinha um plano.
― Suzaninha, decidi ter um filho.
― O quê?!
― Um filho. Você sabe, aquelas coisas que saem de dentro da gente e fazem barulho.
― Mas assim, sem mais nem menos?
Suzana queria dizer "sem casamento nem marido?"
― Sem mais nem menos, não. Será uma coisa muito bem planeada. Para começar, preciso encontrar o homem ideal. É para isso que estou aqui.
― Não era você que dizia que homem só serve para carregar peso?
― E segurar a porta. Mas reavaliei meus conceitos. Também servem como reprodutores, até que inventem coisa melhor.
Samanta pôs-se a descrever o homem que procurava. O físico. O temperamento. O jeito de ser. O posicionamento político ("De esquerda, mas não muito"). E quanto mais Samanta falava, mais Suzaninha sentia um vazio no estômago. Não havia como evitar a conclusão aterradora: Samanta procurava um homem como Gustavo. E Samanta sempre conseguia o que queria. Quando Samanta disse "Mas, me fale sobre você", Suzana já tinha decidido o que fazer. E quando Samanta comentou não podia esperar para conhecer o famoso Gustavo, disse:
― Eu me esqueci. Hoje ele tinha médico.
― Médico? Algum problema?
― Nada demais. Quer dizer, é chato mas...
― Suzeca. Não me diz que...
Suzaninha fez que "sim" com a cabeça. Sim, era o que Samanta estava pensando.
― Disfunção eréctil
― Suzaninha! Mas hoje existem esses remédios...
― Nada funciona com o Gustavo.
Quando Gustavo chegou, deu com as duas irmãs abraçadas no sofá, Samanta acariciando a cabeça de Suzaninha e dizendo:
― Suzeca, Suzeca...
Durante o jantar, Suzaninha viu Samanta examinando Gustavo e pensou: "Ela deve estar pensando ele é tudo que eu queria, mas não serve, maldição, não serve, pobre da Suzaninha."
E Samanta, examinando Gustavo, pensou "Hmmm, essa disfunção eréctil eu curo, ah se não curo". Pois Samanta não apenas descobrira o reprodutor que queria, também descobrira outra causa nobre. Suzaninha ainda lhe ia ficar grata.

Luis Fernando Veríssimo, in "Crónicas Seleccionadas do Estadão"

4 comentários:

Luísa A. disse...

Não há pior do que despertar o espírito «missionário» de salvação numa mulher, Flip. Fá-la absolutamente determinada. Pobre Suzaninha! Parva Suzaninha! :-)

Flip disse...

Luísa,
:-))

Maria Eduarda disse...

Há irmãs que por amor fazem impossível!

Flip disse...


boas irmãs estas...
:-)