segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009



Ideia para uma peça.

No palco, uma mesa posta para 13 pessoas. Copos, pratos e talheres rústicos, grossas velas toscas e, na frente de cada lugar, um cartãozinho com o nome de quem deve sentar-se ali. Ninguém no palco.
Da esquerda aparece um mordomo seguido de um casal elegantemente vestido. O casal entra em cena visivelmente inseguro, olhando para todos os lados. O mordomo anuncia que os outros não demorarão a chegar e diz para o casal ficar à vontade. Se quiserem, podem beber água da moringa. O mordomo sai de cena. O casal se entreolha. Ela diz, num cochicho:
- Onde nós estamos?
Ele, cochichando também:
- E eu sei?
- Olhe o convite de novo.
O homem tira o convite do bolso do smoking e o examina pela décima vez. O convite ainda diz a mesma coisa.
- Só a data, a hora, o endereço e, em baixo, "RSVP".
- Esse "RSVP" é que é a chave de tudo. Deve ser as iniciais de alguma coisa.
- Mas do quê?
- "Reunião dos..." Sei lá.
- Podemos estar no jantar errado.
- Mas o mordomo viu o convite e nos deixou entrar.
- Olhe os cartõezinhos para ver se os nossos nomes estão aí.
Ela (lendo):
- "João", "Tiago", "Pedro"...
Ele (lendo):
- "Mateus", "Simão", "Judas"...
- Viu? Nossos nomes não estão aqui. Estamos no lugar errado.
- "Jesus"!
- Que foi?
- Neste cartãozinho... Está escrito "Jesus"!
Lentamente, eles se dão conta do que isto significa. Fazem a volta da mesa, um para cada lado, lendo os cartõezinhos outra vez. Se reencontram no meio da mesa.
- Aí está - diz ele. - Jesus ao lado de Pedro.
Os dois se encaram, de olhos arregalados e boca aberta. Finalmente, ele consegue falar.
- As letras...
- Que letras?
- Na cruz. Em cima da cabeça de Jesus Cristo. Não eram...
- RSVP!
Ele toma uma decisão:
- Vamos embora.
- Espera. E se a gente ficasse para...
- Está maluca? Isto aqui acaba mal. Não vamos nos meter nesta confusão.
- Mas...
- Olhe, o jantar vai ser horrível, acredite. Só pão ázimo, vinho barato e conversa de homem. Você seria a única mulher. Iria se sentir deslocada.
- Sim, mas...
- E eles, obviamente, não estão nos esperando. Pense no vexame.
A mulher se convence. Tudo menos uma gafe social. Os dois saem furtivamente do palco.

LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO

2 comentários:

Maria Eduarda disse...

Sem dúvida daria uma bela peça de teatro... quem sabe um dia eu volto ao palco e faço uma Madalena em vez de uma Ana? Isto é claro partindo do princípio que Madalena era uma mulher elegantemente vestida... no teatro como na vida tudo é possível.

Flip disse...

tens que contar isso melhor MÉ...
:-)